sábado, 26 de dezembro de 2015

Maria Teresa Horta in Meninas – Lápis-Lazúli, D. Quixote, 2014.

“Em contraluz e falando devagar, modelando as palavras, a mãe disse:
- De ti não quero mais nada! Levo comigo a roupa do corpo e a nossa filha.
Pegou nela, fininha e atordoada, bibe de bordado inglês no peitilho a defender o vestido de organdi cor de romã com mangas de balão enfunadas, pô-la debaixo do braço e, contornando o maple de veludo grená, começou a andar na direcção da porta do escritório, enquanto em silêncio o pai, sentado à pesada secretária de mogno diante dos cadernos de capa de oleado preto e dos livros sublinhados, ficou imóvel,
de uma palidez doentia,
sem no entanto dar qualquer sinal do arrepio que sempre provoca o ínvio encontro com a adversidade. Ao vê-la afastar-se da sua vida: loura e esguia, olhos lápis-lazúli toldados pela mornidade das pestanas, pernas altas à transparência da saia lilás, leve balancear das ancas magras.”


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