sábado, 24 de julho de 2021

Livro: O Avesso e o Direito, Albert Camus, Livros do Brasil, 1ª edição/nov20.

Mais uma estreia, desta vez aventurei-me por um conjunto de ensaios de Albert Camus (1913-1960), alguns deles bastante duros, mas todos interessantes. 

Esta foi a sua primeira obra publicada “(…) em 1937, em Argel, tinha então vinte e três anos. Só em 1958, mais de vinte anos passados, Camus aceitou ver o título reeditado. E ao reler este conjunto de ensaios da sua juventude descobriu neles a raiz dos temas que alimentaria toda a sua obra. Aqui se apresenta o mundo da pobreza, de pó e de luz da sua infância, aqui se reflete sobre a solidão e a indiferença, aqui se vê despontar a descoberta do absurdo da existência. Este é pois, um texto basilar para o conhecimento de um dos grandes autores da literatura moderna, que nunca perdeu, nas suas palavras, «o apetite desordenado de viver»”. 

Por mim, sei que a minha fonte está em O Avesso e o Direito, nesse mundo de pobreza e de luz em que vivi por muito tempo e cuja recordação me preserva ainda dos dois perigos contrários que ameaçam todos os artistas: o ressentimento e a satisfação.”

Apesar de viver hoje sem os cuidados do amanhã, como privilegiado portanto, não sei possuir. Do que tenho, e que me é sempre oferecido sem que o tenha procurado, não posso guardar nada. Menos por prodigalidade, parece-me, do que por uma outra espécie de parcimónia: sou avaro daquela liberdade que desaparece logo que começa o excesso de bens.” 

Em breve ficou só, apesar dos seus esforços e mentiras para tornar mais atraente a sua narrativa. Sem consideração, os jovens tinham-se ido embora. De novo só. Já não ser escutado: é isso que é terrível quando se é velho. Condenavam-no ao silêncio e à solidão. Faziam-lhe notar que ia morrer em breve. E um homem velho que vai morrer é inútil, mesmo incomodo e insidioso. Que se vá. Senão que se cale: é a menor das atenções. E ele sofre porque não pode calar-se sem pensar que está velho.” 

Ele caminhava agora, na doce teimosia do seu passo. Estava só e velho. No fim de uma vida, a velhice transforma-se em náusea. Tudo termina em deixar de ser ouvido.” 

Os homens constroem sobre a velhice que há de vir.” 

Entre este direito e este avesso do mundo,

 eu não quero escolher, não gosto que se escolha.”

Concluindo, senão transcrevo todo o livro, o melhor mesmo é lerem O Avesso e o Direito…


 

terça-feira, 20 de julho de 2021

Livro: A Morte de Ivan Iliitch, Lev Tolstoi, Clássicos Relógio D’Água, 1ª edição/nov07.

Ultimamente, tenho lido livros pouco volumosos e com imenso conteúdo. Tem sido um regalo, se assim posso expressar-me, não, obviamente, por serem “magros” em termos de quantidade de folhas, mas porque tenho aprendido muito e sentido um grande prazer na sua leitura. 

Desta vez, refiro-me a A Morte de Ivan Iliitch, de Lev Tolstoi (1828-1910), não chegam a 100 páginas de puro deleite, a abordagem de um tema que acompanha o homem: a doença, o sofrimento, a dor, a morte.

Qual o significado da nossa vida, porque temos que sofrer para chegar à morte, quem cuidará de nós quando disso necessitarmos?

São muitas as perguntas, poucas as respostas. 

O posfácio é de Vladimir Nabokov, muito bom. 

Como a doença avançava passo a passo, impercetivelmente, era impossível dizer ao certo por que razão, ao terceiro mês da doença, a mulher, a filha o filho, a criadagem, os amigos e conhecidos, os doutores e, sobretudo, ele próprio, já todos sabiam que o único interesse por Ivan Iliitch era conhecer a altura em que, finalmente, ele largaria o seu lugar e libertaria os vivos do incómodo causado pela sua doença, e se libertaria a si próprio dos seus sofrimentos.”

 O sofrimento principal de Ivan Iliitch residia na mentira – a mentira, por todos reconhecida, de que ele estava apenas doente e não moribundo, de que lhe bastava ficar calmo e tratar-se para que o resultado fosse uma coisa muito boa.”

Esta mentira, incidindo nele em vésperas da sua morte, uma mentira destinada a rebaixar o acto solene e terrível da sua morte até ao nível das visitas, dos cortinados e dos esturjões do almoço de família… era muito dolorosa para Ivan Iliitch.”

Finalmente:

Todos havemos de morrer. Porque não haveria de o servir? – disse ele, [Guerássim] exprimindo a ideia de que não se incomodava com o seu trabalho porque o cumpria para um homem moribundo e de que, quando chegasse a sua hora, esperava que houvesse também alguém que se encarregasse desse trabalho para com ele.” 

Obrigatório ler…


 

 

segunda-feira, 19 de julho de 2021

in A Morte de Ivan Iliitch, de Lev Tolstói, Relógio d'Água.

"Como a doença avançava passo a passo, imperceptívelmente, era impossível dizer ao certo por que razão, ao terceiro mês da doença, a mulher, a filha, o filho, a criação, os amigos e conhecidos, os doutores e, sobretudo, ele próprio, já todos sabiam que o único interesse por Ivan Iliitch era conhecer a altura em que, finalmente, ele largaria o seu lugar e libertaria a si próprio dos seus sofrimentos."


Para Nabokov " Esta história é o feito mais artístico, mais perfeito e mais sofisticado de Tolstói."

quinta-feira, 15 de julho de 2021

Livro: Sobre a Leitura, Marcel Proust, Relógio D’Água, 1ª edição/nov20.

Sobre Marcel Proust (1871-1922) já muito se escreveu e eu, uma mera leitora, nada tenho a acrescentar de novo. 

Os meus escritos servem apenas para ensaiar algumas breves e singelas reflexões sobre o que vou lendo e este não é exceção. 

Para começar a ler o escritor, escolhi um pequeno ensaio: Sobre a Leitura, em pouco mais de 40 páginas e 23 Notas de sua autoria, Marcel Proust explana o seu entendimento sobre a leitura, quando começou, o que o prendeu, como a leitura contribuiu para o auto-conhecimento e para melhor entender o Outro. 

O tema à volta da leitura, dos livros e dos escritores suscita-me há muito um grande interesse e realmente em Proust encontrei algumas respostas para o meu gosto e necessidade contínua de ler: 

Ler, era para Proust, mais do que a procura de conhecimento, uma atividade espiritual, um meio de se transformar e transcender. Ao lermos os grandes romances, afirma, entramos em contacto com ideias fantásticas e as mentes mais inspiradoras do mundo.” 

“…a leitura é exatamente uma conversa com homens [e mulheres] muito mais sábios e muito mais interessantes do que aqueles que poderemos ter oportunidade de conhecer à nossa volta.” 

“…aquilo que difere essencialmente entre um livro e um amigo não é a sua maior ou menor sabedoria, mas a maneira que temos de comunicar com eles, consistindo a leitura para cada um de nós, ao contrário da conversação, em recebermos a comunicação de um outro pensamento, mas permanecendo sós, quer dizer continuando a gozar da força intelectual que temos na solidão e que a conversa dissipa imediatamente, continuando a poder manter a inspiração, a permanecer em pleno trabalho fecundo do espírito sobre si mesmo.”

Sentimos muito bem que a nossa sabedoria começa onde a do autor acaba e quereríamos que ele nos desse respostas, quando tudo o que ele pode fazer é dar-nos desejos.” 

E finalmente: 

“…palavras de Descartes: a leitura de todos os bons livros é como que uma conversação com as pessoas mais bem-criadas dos séculos passados que foram os seus autores.” 

Um ensaio estupendo para ser lido por todos aqueles que sabem ler e escrever, sintam-se convidados…