“A
menina empurra de manso com a ponta dos dedos a porta do quarto dos pais e,
pela frincha que deixa estreita, dirige os olhos relutantes até à cama, colcha de
cetim cor de cravo rosado que os corpos entrançados enrodilham, nó de nudez e
de gemidos e gritos mordidos como sempre, as ancas direitas do pai envolvendo a
lonjura das pernas altas da mãe, que se entrega enquanto inclina para trás a
cabeça, linha intacta e pura das costas por onde desce a correnteza loura dos
cabelos, indo enroscar-se na tepidez da luz coada pelo tom de marfim das
cortinas de renda. Caracóis molhados pelo suor que lhe perla a garganta frágil,
caule de lírio alvo de onde parte aquela espécie de uivo mordido, espécie de
rugido selvagem de quem se descobre a si mesma entretecida e dúbia, lâmina da
qual sente o gume sem entender o motivo, intuindo mais do que sabendo o
desvario e a vertigem.
De
súbito aturdida, a menina amedronta-se, (…)”
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