terça-feira, 29 de setembro de 2015
Maria Teresa Horta, Lilith, in Meninas, D. Quixote, 2014.
Iniciei a
leitura da obra “Meninas” de Maria Teresa Horta. É um livro de contos e ao ler
o primeiro, Lilith (a primeira mulher), deparei-me com a mais extraordinária e
fascinante narrativa dentro de um ventre materno, de uma riqueza de
sentimentos, de uma beleza plástica que me comoveu, enquanto mulher, mãe e
sobretudo, enquanto filha. Fabuloso!
Que outras
surpresas me aguardarão?
“Viras-te de costas com lentidão indiferente,
obrigando-me à imobilidade, emparedada pelos teus músculos, entre tendões,
artérias e ligamentos; os ossos das ilhargas a demarcarem-te o ventre, nos
quais desatenta me magoo e me detenho, sufocando, arfando um tudo-nada. Paro,
engulo os humores espessos que se formaram na minha garganta, e desloco-me com
a intenção de copiar as posições que tomas na cama; e desse modo chego à tua
beira, pelo sítio onde se inicia a subida até à tua cintura agora inexistente.
Numa
avidez febril.”
“Surpresa, sinto chegar a dor: seta afiada,
ácida, laminada, a lacerar-me as articulações dos braços, idênticos a delgados
juncos, enroscados em torno do lugar onde fantasio situar-se a curva das tuas
ancas. Iço-me, relutante, pois deixei de escutar-te os gemidos, não obstante
continuar a saborear-te o áspero sal das lágrimas, que me enchem a boca com o
sabor ázimo da vertigem. Por segundos aquieto-me interdita, até julgar
reconhecer ao longe o azul transparente do cintilante cristal dos teus olhos. E
apesar das sombras, retrocedo no sentido inverso daquele para onde, sem dar por
isso, começo a ser empurrada, mansa na tentativa de ganhar alento, nesse
devaneio regressando ao ponto de partida.”
segunda-feira, 28 de setembro de 2015
Plano de leituras: literatura no feminino.
Agora que terminei a leitura d'A Casa da Aranha, vou iniciar um novo plano de leituras: literatura no feminino.
Começo pela minha querida Maria Teresa Horta e as suas Meninas, depois seguirei para outra grande Mulher, de seu nome Simone de Beauvoir.
Do mesmo plano fazem parte, Marguerite Duras, Virginia Woolf, Jane Austen, Alice Munro, Flannery O'Connor, Doris Lessing, Agustina Bessa-Luís e a Elena Ferrante que vem a caminho.
Livro: A Casa da Aranha, Paul Bowles, Quetzal, 2014.
Após
uma viagem ao Japão pela mão de Murakami, acompanhei Paul Bowles até Marrocos,
mais precisamente até Fez, uma cidade muito antiga, milenar, ocupada nos anos
cinquenta, pelos franceses.
A Casa da Aranha foi a minha
última leitura, uma obra muito interessante e muito atual, versando sobre “…o encontro e o conflito entre
civilizações…”.
Numa
narrativa muito bem estruturada, Bowles, leva-nos ao âmago da cultura árabe e
do conflito que se estabeleceu entre os nativos marroquinos e os colonizadores
franceses.
“Islamismo, a religião da resignação. Jamais
ocorrera a Stenham que a palavra «islamismo» realmente significava «resignar-se.»”
“A cidade (Fez) ainda lá está. Já não é o
centro intelectual e cultural do Norte de África; é simplesmente mais uma
cidade atormentada pelos problemas insolúveis do Terceiro Mundo. Nem todas as
devastações causadas pela nossa impiedosa era são tangíveis. As formas mais
subtis de destruição, aquelas que envolvem somente o espírito humano, são as
que mais devem ser temidas.”
Paul
Bowles, Dezembro de 1981.
“O semblante daqueles que escolhem outros
patronos que não Alá é como o semblante da aranha quando ela forma para si uma
casa, e vede como a mais frágil de todas as casas é a casa da aranha, se eles
ao menos o soubessem.
Alcorão”
Foi
uma leitura inquietante e por esse facto recomendo a sua leitura.
sábado, 19 de setembro de 2015
Eugénio Lisboa in Pagadores de promessas, JL nº 1173 de 2015.
Quando li o texto que Eugénio Lisboa escreveu para a última edição do JL, veio-me à memória outro texto que Lisboa escrevera para o JL nº 1113 de 2013-08-21, a propósito da publicação da obra "Jorge de Sena/João Gaspar Simões Correspondência (1943-1972)" e sobretudo, o paralelismo que senti entre a dedicação de Teresa Martins Marques à obra, ao pensamento e ao trabalho de Amadeu Ferreira, tal como escreveu Eugénio Lisboa: "Uma monumental dádiva biográfica que Teresa Martins Marques quis consagrar a essa grande figura do intelecto, da acção e do coração, que foi Amadeu Ferreira há pouco falecido." e a dedicação com que Mécia de Sena "a viúva prodigiosa" se entregou ao longo de mais de trinta e cinco anos a organizar, a estudar e a divulgar a obra e o legado de Jorge de Sena.
Mulheres.
quarta-feira, 16 de setembro de 2015
sábado, 12 de setembro de 2015
Livro: underground - O atentado de Tóquio e a mentalidade japonesa, Haruki Murakami, Tinta-da-China, 2006
Terminei
finalmente a leitura desta obra, não propriamente literária, mas do género
testemunhal.
Foi
a minha estreia com este escritor japonês, um escritor de quem já tinha ouvido
falar muito bem. Foi um livro que me impressionou e por vários motivos, em
primeiro lugar, o tema, o ataque com gás sarin no metro da cidade de Tóquio em
20-03-1995, um atentado perpetrado por uma seita religiosa, a Aum Shinrikyo. Já
se passaram 20 anos, mas lembro-me bem do assunto que foi amplamente noticiado
nos meios de comunicação social de então. Uma tragédia.
Impressionou-me
que o escritor tivesse sentido a necessidade de reunir e publicar sob a forma
de livro, um conjunto de testemunhos, resultantes das muitas entrevistas que
efetuou a sobreviventes, familiares e ainda a alguns membros da seita. Murakami
sentiu que o assunto ainda não se encontrava esgotado, necessitava de
compreender o porquê, e principalmente de dar voz às vítimas e aos seus
familiares.
Apreciei
bastante a forma sóbria, respeitosa e muito cuidada com que o escritor abordou
os testemunhos e escreveu sobre o que ouviu. E também a forma como organizou esses
mesmos testemunhos, antecedendo cada conjunto de testemunhos e mesmo cada
testemunho de um texto introdutório e explicativo do enquadramento do que se
seguia.
Achei
uma obra muito interessante, quer do ponto de vista humano, pois fiquei a
conhecer bastante melhor a cultura e a forma de ser e de sentir da cultura e
sociedade japonesa, quer de um ponto de vista literário.
"Ora
pois, e como é que se faz para compreender melhor o Japão?
Tinha
uma ideia bastante clara do que procurava. No fundo o que se passava era que,
tendo feito uma boa limpeza a todas as minhas questões emocionais, precisava de
saber mais sobre o Japão enquanto sociedade. Tinha de aprender mais sobre os
japoneses no seu conjunto, enquanto forma de consciência. quem éramos nós como
povo."
Com
a certeza de voltar a este escritor, termino esta reflexão, recomendando a
leitura de "underground" de Haruki Murakami.
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