Iniciei o Novo
Ano de forma auspiciosa, Vinte Horas de Liteira de Camilo
Castelo Branco, era o primeiro livro de um novo plano de leituras no
masculino, só escritores de língua portuguesa.
O ano não podia ter
começado com melhor leitura, neste pequeno romance composto por curtas histórias, umas trágicas outras
nem tanto, cheias humor e ironia, criadas durante uma viagem de vinte horas em liteira, entre Ovelhinha «póvoa escondida nos fraguedos do Marão», e o Porto, os dois passageiros, dois amigos, o dono António Joaquim e o narrador, constroem um retrato vibrante de uma sociedade rural do último
quartel do século XIX.
Como refere o
prefaciador deste volume da coleção “Obras Escolhidas de Camilo Castelo branco”
publicada pelo jornal Expresso, Mário Cláudio:
“Os
dezasseis relatos, seguidos de «conclusão» e «epílogo», que constituem esta coletânea
procedem sobre um espírito de um impulso digressivo, quer por se inscreverem
numa viagem, quer por conterem substância decorrente de múltiplas
peregrinações, levadas a cabo pelos seus intervenientes. Se a isto ajuntarmos a
constante divagação coloquial do narrador e do ouvinte que de quando em quando
o interrompe, teremos esboçado um espetáculo de imparáveis dinâmicas, cridas
pelo engenho febril do seu verdadeiro encenador.”
Aprecio e
aprendo sempre muito com a riqueza e singularidade do léxico e da sintaxe do escritor:
“Este rapaz,
que é velho hoje, e se chama Lourenço Pires, foi no seu tempo um gentil mocetão,
tocava clarinete nas chulatas, era o benquisto das malhadas e escapadelas,
homem para o seu homem, estimado das raparigas, e amado de algumas, que, por
amor dele, se fingiram endiabradas para não casarem à vontade dos pais.”
“Rimos
também dos que se amiseram e descabelam, porque a sua dama os desdenha
desamoravelmente ou porque as contingências da vida os estorvam de se enlaçarem
com as pombas que os anjos lhes mandaram e as boízes dos homens lhes prenderam.”
Antevendo um ano
dedicado ao estudo de matérias aduaneiras e fiscais, procurarei
intervalar com a leitura dos nossos melhores, por agora resta-me convidar-vos
para esta viagem prazerosa em liteira…