sábado, 27 de fevereiro de 2016

Livro: Um Bom Homem é Difícil de Encontrar, Flannery O’Connor, Relógio D’Água, 2015.

Continuando na senda de cumprir um plano de leituras no feminino - exceptuando o Livro do Desassossego do heterónimo Bernardo Soares -, terminei a leitura de Um Bom Homem é Difícil de Encontrar, da escritora norte-americana Flannery O’Connor. Natural do estado da Geórgia, localizado no Sul dos USA, ali nasceu em 1925, tendo vindo a morrer cedo, aos 39 anos, de acordo com a sua biografia, O´Connor, era uma católica devota.
O livro é composto por 10 contos. Contos que espelham bem a realidade social da América sulista, nas suas vertentes, racista e rural. Contam histórias bizarras e grotescas, de verdadeiro humor negro.
Quando iniciei a leitura do primeiro conto, cujo título dá o nome ao livro, o meu pensamento começava a construir uma imagem bastante agradável, quer pela forma magistral de escrever da autora, quer pelo enredo que ora se desenrolava, de repente, sofri um baque, afinal a linha condutora da história seguia por um caminho completamente inesperado, o tal humor negro de que falara há pouco. O final do conto é realisticamente cruel. E são assim, quase todas as restantes narrativas.
O último conto, O Refugiado, é aquele que melhor retrata a sociedade rural do Sul dos USA, a relação entre os brancos, os pretos e os refugiados da Segunda Guerra Mundial, que procuraram refúgio nos USA, vindo trabalhar para as grandes quintas no Sul do imenso e rico país.

Um livro perturbador, com uma prosa encantadora…




sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Agustina Bessa-Luís.

“Governantes
No fundo agradece-se que não haja grandes governantes; eles trazem a ordem, portanto a proibição de escolha a uma consciência em estado de profunda reprovação. Um governante iluminado causa mais males do que duzentos que estejam pouco empenhados na felicidade humana.”





quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Maria Teresa Horta in Perecível, Meninas, D. Quixote, 2014.

“Desculpa, se parece que não te compreendi ou te fiz crer de algum modo que não me importo contigo como sempre me importo. Desculpa se deixei que desligasses o telefone com a tua voz tão perto das lágrimas e eu sem conseguir dizer nada, palavras atadas na garganta com o nó da aflição, tal como eu invisível em criança, tantas vezes sumida, ensimesmada e magrinha, quase transparente, pequeno animal selvagem acossado e vigiado, perseguido ao longo da minha memória de menina a aninhar-se no tojo seco, a tentar esquecer a realidade do abandono.
Mas hoje ainda a esbracejar como se me afogasse.

Dor e luto entrelaçados no lado esquerdo do meu peito.”


quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Virginia Woolf in Rumo ao Farol, II – O Tempo Passa, Relógio D’Água, 2008.

“Eis que, então, com todas as luzes apagadas, a Lua declinou, e uma chuva fina, fazendo tamborilar no telhado um aguaceiro de imensa escuridão, principiou. Nada, dir-se-ia, seria capaz de sobreviver à enxurrada, à profusão da treva que, insinuando-se pelas fendas e pelas fechaduras, silenciosamente alcançava os quartos, penetrava neles, engolia aqui um jarro e uma bacia, além uma taça de dálias vermelhas e amarelas, acolá a aresta colante e o vulto firme de uma cómoda. E não era apenas a mobília que se confundia; havia muito pouco de corpo ou de espírito que, por si só, consentisse que se dissesse «Isto é ele» ou «Isto é ela». Por vezes, uma mão se erguia, como que para prender ou desviar qualquer coisa, ou alguém roncava, ou ria alto, como que partilhando um gracejo com o vácuo.”


terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

David Mourão-Ferreira in Auto-análise aos dezoito anos, JL nº 1184 de 2016-02-17.

“Hebraico-mourisco, meu nome

Hebraico-mourisco, meu nome,
Não sei o que quer dizer,
Sei que não matas a fome
A quem me quer conhecer.
Quem me quiser conhecer
Tem que descer mais ao fundo
Do que o nome lhe disser;
Por trás do nome, há um mundo.
Quem quiser é só descer.”



segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016