domingo, 31 de dezembro de 2017

Livro: Os Maias, Eça de Queirós, Círculo de Leitores, 1978.

Esta madrugada terminei a leitura deste notável romance de Eça de Queirós, sendo um livro de leitura de estudo obrigatório é por isso, mal-amado por muitos estudantes do ensino secundário, é um romance com muitas páginas, complexo, mas também muito completo do ponte vista da sintaxe, possui uma escrita límpida e clara e mais do que uma estória de amor, traça um retrato fiel e irónico, da sociedade portuguesa, especialmente da lisboeta, na segunda metade do XIX.
As classes sociais e políticas, as convenções sociais são aqui esmiuçadas e retratadas de uma forma impiedosa e sarcástica.
Através dos personagens que criou e que passam diante dos nossos olhos, fiquei fã do João da Ega, conseguimos compreender porque este é o Romance que todos os estudantes devem ler e desfrutar.

Depois Carlos, outra vez sério, deu a sua teoria da vida, a teoria definitiva  que ele deduzira da experiência e que agora o governava. Era o fatalismo muçulmano. Nada desejar e nada a recear… Não se abandonar a uma esperança – nem a um desapontamento. Tudo aceitar, o que vem e o que foge, com a tranquilidade com que se acolhem as naturais mudanças de dias agrestes e de dias suaves. E, nesta placidez, deixar esse pedaço de matéria organizada que se chama o Eu ir-se deteriorando e decompondo até reentrar e se perder no infinito Universo… Sobretudo não ter apetites. E, mais que tudo, não ter contrariedades.
Ega, em suma, concordava. Do que ele principalmente se convencera, nesses estreitos anos de vida, era da inutilidade de todo o esforço. Não valia dar um passo para alcançar coisa alguma na Terra – porque tudo se resolve, como já ensinar ao sábio do «Eclesiastes», em desilusão e poeira.

É um romance intenso, de leitura fácil, uma estória de uma atualidade desconcertante, não temam, mergulhem na leitura de Os Maias e não se vão arrepender, bem pelo contrário...


sábado, 9 de dezembro de 2017

Livro: Lápides Partidas, Aquilino Ribeiro, Círculo de Leitores, 2008.

Terminei há pouco a leitura de mais um romance de Aquilino Ribeiro (AR), já lá vão quatro e tenho ainda o triplo para desfrutar.

Gosto de regressar a AR, sinto mesmo uma certa necessidade intelectual e literária de continuar a descobrir os nossos clássicos, pela sua forma plástica de nos transmitir ideias e acontecimentos, pela sua intemporalidade, infelizmente nem sempre pelas melhores razões.

Dos romances que li de AR, Lápides Partidas é o primeiro cuja ação decorre maioritariamente em Lisboa, mercê da vinda para a cidade de Libório, o personagem à volta do qual se desenvolve toda a trama. Libório, é um jovem homem, cheio de ideais republicanos que vem para a capital à procura de trabalho e sobretudo anseia participar na ação revolucionária de derrube da monarquia vigente.

O romance permite-nos compreender o estado em que se encontrava o país, política, económica e socialmente, é um retrato de um país pobre, atrasado, um quase salve-se quem puder.

Libório questiona-se, quando já no final, foge do país tendo como objetivo chegar a Paris, para tal passa a fronteira em direção ao país vizinho e sente logo a diferença:

(...) Era Espanha, gente de Espanha; outra louça.
(...) Lá está Aldeia del Obispo ao fundo da encosta, saraivada de branco … e um aspecto sério de aglomeração ordenada e progressiva; lá estão sulcando o céu claro, como as linhas de papel de música, suspensos de paralelogramos certos e espaçados – os paralelogramos da civilização – os fios da electricidade, do telefone, do telegrafo.
(...) Porquê? Porque é que esta má sina persegue ao «triste do lusíada, coitado» Não sei. Mas uma das ilações a tirar será esta: desde tempos imemoriais que andam falseadas nesta terra as barras de comando. A tragédia de Fevereiro [assassinato do rei e do príncipe] tem de ser vista à luz pavorosa deste prisma.

E termina, concluindo, este notável romance:

E a que luz as outras realidades? Sim, porque a gente da minha terra, eu, meus pais, os cavadores, os meus amigos, o meu espírito, o nosso espírito correm mundo sob um manto de desdita e menoscabo!”

É uma aprendizagem permanente e prazerosa, sobretudo em termos linguísticos, ler Aquilino Ribeiro!

Recomendo vivamente que partam à descoberta dos nossos clássicos…