quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Maria Teresa Horta in A Ilha, Meninas, D. Quixote, 2014.

“Os andores floridos, levados aos ombros pelos homens, pareceram-me oscilar perigosamente. Olhei à roda, se bem que temesse encontrar a enorme figura
do Senhor dos Passos todo de roxo, cruz ás costas e joelho na terra, imagem terrifica que eu conhecia da igreja de Benfica em Lisboa, e que desde o primeiro domingo em que a avó me levara à missa e eu a vira tanto me atemorizara, me envenenará as noites em sobressalto,
o sangue a escorrer-lhe pelas faces laceradas, o sangue das feridas que a coroa de espinhos rasgara na testa onde com crueldade se enterravam, o sangue das chagas que as chicotadas dos soldados romanos abriram. Mas a figura que encontrei no andor oscilante mais perto de mim, apesar da sua ostensiva, desmesurada dor, e da imensa secura do seu olhar, era bem menos aterradora.”





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