sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Livro: Tratado sobre a Tolerância, Voltaire, Relógio D’Água, 2015.

Enquanto os ataques terroristas se sucediam em França, o interesse por esta obra de Voltaire saiu da Academia onde é estudada há muito e veio para o grande público francês, mas não só, através da comunicação social e das redes sociais.
A partir de um acontecimento real relacionado com a morte de um jovem, alegadamente perpetrada pelo próprio pai com a ajuda da mãe, do irmão e de um amigo, por motivos religiosos, o que se vem a revelar um cruel erro judicial, pois o jovem tinha cometido suicídio, também por questões religiosas, Voltaire analisa e reflete sobre a tolerância e intolerância religiosas ao longo dos tempos:

Porque ou os juízes de Toulouse, levados pelo fanatismo da populaça, fizeram supliciar na roda um pai de família inocente, o que é sem exemplo; ou esse pai e a sua mulher estrangularam o seu filho mais velho, ajudados neste parricídio por um outro filho e por um amigo, o que é contrário à natureza. Num e noutro caso o abuso da mais santa das religiões produziu um grande crime. É pois do interesse do género humano examinar se a religião deve ser caridosa ou bárbara.”

Voltaire discorre sobre o direito natural, “aquele que a natureza indica a todos os homens”, e o direito humano, que “deve ser fundado, sem excepção, sobre o direito da natureza” e sobre aquele que considera o grande princípio universal que devemos seguir: «Não faças aos outros o que não queres que te façam a ti», ele recua até ao tempo dos gregos, dos romanos, dos primeiros cristãos, sem deixar de referir os povos que compunham o mundo conhecido: chineses, indianos, egípcios, árabes, etc.
Voltaire escreve:

Assim é, pois, quando a natureza faz, pelo seu lado, ouvir a sua voz doce e benfazeja, o fanatismo, esse inimigo da natureza, faz, pelo seu lado, soltar urros, e quando a paz se apresenta aos homens, a intolerância forja as suas armas.” 
Clama: “Ó vós, árbitros das nações, que haveis dado a paz à Europa, escolhei entre o espírito pacífico e o espírito homicida!”

E conclui:

“Há um edifício imenso que eu [a natureza], com as minhas próprias mãos, construí os alicerces: era sólido e simples, todos os homens podiam entrar nele sem temer nada; quiseram acrescentar-lhe os mais bizarros, os mais boçais e os mais inúteis ornamentos; para onde quer que voltemos, o edifício cai em ruínas; os homens agarram nas pedras e atiram-nas uns aos outros; eu bem lhe grito: Parem com isso, afastai todo esse entulho funesto que é obra vossa, e ficai ao pé de mim, em paz, no edifício inabalável que é o meu.”

Este é um livro de apenas 153 páginas, mas, imenso de significado e reflexão.

Recomendo vivamente a sua leitura, mas de uma forma conscienciosa, eu voltarei a ele com certeza…



Sem comentários:

Enviar um comentário